especial tragédia da Kiss

5 anos de união

Foto: Charles Guerra (Diário)
Nova pintura do prédio da Kiss, finalizada nesta sexta

É pelo compromisso coletivo de respeitar a memória e transformar a dor da ausência em homenagem que um memorial às vítimas da tragédia da boate Kiss já tem encaminhamentos concretos. Cinco anos depois de muitos debates, o destino do prédio 1.925 da Rua dos Andradas foi acertado: no prédio que ainda guarda as marcas do 27 de janeiro de 2013 será eternizado em um memorial.  

Pelos menos três projetos chegaram a ser enviados aos familiares, antes do concurso encampado pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB-RS) e lançado oficialmente em 10 de julho deste ano, mesma data em que o prefeito assinou a desapropriação do prédio. O processo, que prevê três fases e escolherá um projeto vencedor para a construção do memorial, tem apelo colaborativo e amparou-se na campanha protagonizada pela expressão "abrace", durante toda a primeira etapa.  

Por meio de um financiamento coletivo na internet e com doações entregues pessoalmente à Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), a meta mínima de arrecadação, de R$ 150 mil, foi atingida em 24 de novembro.  

O edital e a abertura das inscrições do concurso serão lançados neste sábado, 27 de janeiro de 2018. A divulgação do projeto vencedor será em abril. 

_ Ali na campanha, eu vi que não estávamos sozinhos. Tinha gente que nem sabia o que falar, mas, contribuindo ou não, seja com uma moeda ou qualquer valor, parava na tenda e nos dava um abraço, compreendia nossa luta _ lembra Ligiane Righi da Silva, mãe de Andrielli, vítima do incêndio.

Na última quinta-feira, após os advogados assistentes de acusação expressarem o desejo de manter o prédio onde funcionava a boate Kiss preservado até o julgamento e, no caso de ir a júri popular, levar os jurados para inspecionar o imóvel, a demolição foi adiada pela prefeitura, que ainda não tinha confirmado uma data para tal.  

O prefeito Jorge Pozzobom afirmou que manterá a estrutura em pé até o julgamento do recurso pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) que dirá se os réus serão ou não julgados pelo Tribunal do Júri. O prédio, cujas chaves estão sob o resguardo de Flávio Silva, vice-presidente da AVTSM, amanhecerá, amanhã, com novas cores na fachada e um conceito baseado na união dos povos. Em dezembro passado, uma parceria entre AVTSM e Organização das Nações Unidas (ONU) foi anunciada. 

 

TENDA DA PRAÇA 

Na Praça Saldanha Marinho, no Centro de Santa Maria, é que se instalou, desde o primeiro ano, um marco de resistência, solidariedade e transformação. É na chamada tenda da vigília que se resiste aos olhares e comentários mais desumanos de uma cidade. "Deu de Kiss, já passou", dizem muitos. Mas, também é nessa tenda que a solidariedade é protagonista, principalmente, em todos os dias 27 ou em datas como Natal, Dia da Criança e Páscoa, quando campanhas do agasalho, de doces e de brinquedos promovem momentos de alegria e dignidade a crianças carentes. Sobretudo, é ali, debaixo de uma estrutura em lona com um mural das vítimas ao fundo, que as tragédias comuns àqueles pais os unem e transformam meros conhecidos em novas famílias. 

 

ASSOCIAÇÃO DE PAIS 


Há menos de cinco minutos dali, em outro local compacto, sem muita visibilidade, já que ocupa o sexto andar do prédio da antiga Reitoria da UFSM, na Rua Floriano Peixoto, está a sede oficial da AVTSM, que organiza protestos e homenagens e luta pelos direitos dos familiares e sobreviventes. É um professor da UFSM, Robson Machado, 38 anos, o contador da AVTSM. Ele audita a parte financeira, executa o levantamento de demonstrativos contábeis da associação e aprende todos os dias. 

_ Com eles, aprendi que dor, cada pessoa tem a sua. Aprendi que devemos fazer a nossa parte para cobrar da sociedade. Lembro que, no início, após a tragédia, havia muita comoção na cidade, mas, com o tempo, foi esquecendo-se. É por isso que essa associação existe. Não sei o que seria desse caso se a AVTSM não estivesse lutando diariamente.

A rede de associados teve, no início das atividades, Adherbal Ferreira na presidência. Junto de outros familiaires de vítimas, criou a entidade na busca de atendimento à saúde dos sobreviventes, na luta por justica e na promoção de ações sociais. Dois anos depois, o líder da luta cedeu seu lugar, ocupado, desde então, por outro pai, Sergio Silva.  

_ Nenhum de nós queria essa associação, ninguém queria memorial, essa loucura toda. No mais ardido dia da minha vida, quando houve toda a tragédia, precisei erguer forças, não sei como, e forjar a ferro e fogo um meio de imprimir no meu coração algo que me sustentasse para continuar em pé. Foi com minha fé e equilíbrio que chegamos a montar uma associação, sem, na verdade, imaginar o que era isso. Mas era o que tinha de ser feito naquele momento. E foi feito, Deus sabe por quê" _ diz Adherbal.

E, mantendo lembranças de uma ou outra luta, com técnicas autodidatas de um MMA em que Sergio costumava rolar e brincar pelo chão da sala com os filhos Julio e Augusto, que tira forças para legitimar seus direitos e sua luta por justiça. 

_ Meu filho (Augusto), inclusive, fazia o curso de Direito. Ele já partiu, mas, como sou um cidadão, o Estado deve respeito a mim. Se omitir disso é se omitir dos próprios direitos. É para que nenhuma outra tragédia se repita que estou aqui desde que a associação foi fundada _ afirma Sergio.



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